quinta-feira, 24 de junho de 2010

O NOME DAS COISAS

 "Há lágrimas na natureza das coisas 
e a certeza do efêmero nos toca o coração." (Virgilio)


   Os sentimentos são dinâmicos em relação as coisas que possuíamos e deixamos de possuir, se constroem e se desconstroem empiricamente. Nos acompanham sem percebê-los e se frutificam como desejos  ao  longo da existência. Assim vão se acumulando na memória até nos ensinar nomes verdadeiros e não inventados por nós. 
   A vida de Otto foi assim. Recebeu o primeiro presente um gato siamês, nem sabe quem foi. Era a festa dos seus 10 anos. Se recorda do  nome era "Zabe", dos olhos azuis e relembra dos carinhos. O leite no pires feito mimo pelos cantos da casa eram constantes; das brincadeiras e dos cuidados que  rodeavam a convivência dele com seu primeiro animal de estimação. Aquilo era novo para Otto. Ter um sentimentos retribuído, como era algo espetacular dar nome a seres vivos. 
Um dia, Zabe apareceu aos tombos pela casa  parecia está doente, ou pior, envenenado. Na frente de todos suspirou sete vezes. O gato faleceu e deixou o nome na memória. A suspeita de que algum vizinho teria sido o mandante de tal mal feito ficou na cabeça dele, mas logo desapareceu. A inocência foi se transformando em desconfiança e o sentimento de perda pelo de vingança.  Um velório foi providenciado com direito a vela e caixão. 
   Para não deixar o fato acontecer de novo.Os pais preocupados, resolveram lhe presentear com um pássaro. Escolheram um nome: Fênix. A gaiola fez Otto ficar pensativo com os voos limitados do pequeno pássaro, com a solidão de se cantar sozinho. Será que Fênix estava acostumado com a gaiola? Otto resolveu testar e deixar a porteira um pouquinho aberta. Num piscar de olhos, viu ir pela janela da casa, sem voltas e sem cantar sua Fênix. o susto e a gaiola vazia gerou um sentido de desamparo, de desencanto.
   O tio soube do ocorrido e lhe trouxe um aquário com quatro peixes. Otto como de costume nominou  cada um deles. As fêmeas eram  Julieta e Isolda; e os machos: Tristão e Romeu. O aquário tinha um castelo no fundo ficou na sala. Otto observava por horas o nadar dos peixes que o deixava mais paciente e com a certeza de que ninguém iria envenená-los e nem haveria a possibilidade de saírem do aquário  Limpava o aquário regularmente e sempre era cauteloso com a alimentação. Uma tragédia  se anunciava: a mesa onde estava o aquário com os peixes era velha. Numa tarde, a mesa rompeu-se levando ao chão o aquário e matando Julieta, Isolda, Romeu e Tristão. Quando chegou em casa não tinha ninguém, sozinho viu a cena dos quatros peixes ainda pulando pela sala querendo aquário e encontrar vida. Tarde demais. Otto ficou silencioso e era ruim  aprender com os bichos de estimação o sentido da morte e das ausências. 
   Novamente tinha a vontade de ter um bicho de estimação para superar o anterior e o que interessante dar-lhe um nome. Resolveu  ir ao Zoológico, poderia ser uma forma de acalmar o amor pelos animais, mas acontece que depois de vê-los e admirá-los, existe a separação na saída. Desistiu de ir sempre ao zoológico.
Apesar da promessa de não cuidar mais de bicho nenhum,um novo hospede veio a casa nos dias seguintes. Um estranho levou uma caixa até a frente da casa e deixou na porta. Nela tinha um cachorro ainda novinho, ao vê-lo se apaixonou e pôs o nome de Èdipo. Fez juras de que não abandonaria ele e que o destino seria menos cruel. Se Otto ia para a cozinha de lá olhava Édipo dando os primeiros passos. O tempo parece que se encarregou de apagar as lembranças do passado para um carinho maior e brincadeiras no presente. Com Édipo por cima do tapete da sala, Otto se entregava ao prazer de estimar animais; o cachorro cresceu um pouco e o suficiente para ser a companhia dele na praça quando sai. O transcorreu tanto da amizade se consolidou e Édipo ficou bonito e chamava a atenção de todos. Certa manhã, Otto percebeu que Édipo tinha sido roubado. Assim como o presentearam também o leveram. Colocou anúncios em jornais e na televisão, as semanas se passaram e nada. Novamente ele ficou decepcionado com o gostar e querer de animais e pessoas que morrem pelo sofrimento que trazem ao falecerem ou ao desaparecerem. Os sentimentos de ligação não são bons, fazem sofrer.
   Otto procurou contornar a ligação com os seres vivos. A relação mútua de sentir-se amado e amar e preferiu transferi-lá para outras instâncias. Inventou vida com humor e amargura aos seus pertences, construiu histórias românticas e nomes com apelidos aos objetos que estavam espalhados pela casa. Primeiro veio a cama: Serena. A mesa se chamava Prazeres...Como um criador determinou ordens e posições que o ligava a funções de cada um dos objetos  e nada lhe escapava. Lembrava dos pegadores de roupas no varal: Zé arrochado, Bicudo, Paulo Midin...As vezes, quando chovia de noite, ele acordava e ia até o quintal retira-los de lá. Os fósforos eram chamados de Luís I, Lume II e assim por diante.  Seria consciente em saber que os objetos não morrem naturalmente igual aos viventes, os objetos podem ser recuperados e ficarem eternos se possuirem atenção e cuidados devidos. Não precisam de vacinas, rações e banhos ou passeios matinais. Eis a diferença entre ter bichos de estimação e objetos de uso e cuidado. 
No entanto, ao voltar do trabalho num dia, Otto encontrou toda a sua casa rouba. Aquele objetos com nomes e histórias agora estavam desaparecidos da memória e assim como se fora seus animais de estimação. Nada escapava aos sentimentos de decepção em curtas lágrimas e de morte na vida dele, nem os bens materiais que nunca foram recuperados.

2 comentários:

Manúh -. disse...

kkkkkkkkkkk amei! muito muito divertida a história e um pouco comovente. Coitadinho do Otto =/ kkkkkkk ... adorei a história!!

G. Rafaelly disse...

Muito Legal, bem interessante.
É uma boa lição de vida, mostrando que não devemos nos apegar as coisas, pois sempre se acabam,tudo na vida é assim:tudo nasce sem pedir, vive sem saber e morre sem querer... Tudo pode acontecer e um dia se acaba.