domingo, 18 de dezembro de 2016

Um presente

Como não podia ajuda-lo na marcenaria por ser um trabalho pesado, o garotinho o acompanhava para os lugares. Aquela amizade entre os dois se revelava em gestos comuns para os demais familiares e que somente ambos sabiam que os ligavam: "Me dê a mão." Disse o pai a Sandro e atravessaram a avenida. Havia um cumplicidade naquelas duas mãos passando a rua. As vezes, Sandro chegava da escola, corria até a marcenaria e estendia a mão o boletim para o homem envolto em serragem, ele deligava a máquina e olhava as notas. Sorria e estava feito o pacto novamente que ligava pai e filho.
Nesse tempo havia dificuldades financeiras que eram contornadas. O básico era mantido para uma família numerosa. Para suprimir um aniversário ou feriado, o pai fazia um piquenique na praia. Noutras ocasiões, após fazer uma entrega de portas e janelas,  trazia umas revistas infantis para filhos, Adorava ficar na sala vendo as crianças lerem. Vez ou outra dava um dinheiro para os filhos irem o cinema no domingo. Assim, o tempo se movia entre eles.
Era quase natal e o dinheiro, pouco. contudo. o suficiente para quitar as dívidas e a esposa fazer  a ceia. Não se conversava sobre presentes e  nem papai noel, pois isso poderia despertar o desejo de presentes. Na semana, 0 pai precisou ir ao banco no centro e levou Sandro. Quando estavam voltando, o menininho solta da mão do pai e correndo entrou numa loja de brinquedo. Ficou encantado com os jogos, bonecos e aparelhos eletrônicos. Andou por entre as prateleiras e viu um xilofone e ficou maravilhado com som. Agarrou com as mãos. O tempo de encantamento foi suficiente para o pai entrar na loja, procurar o filho e pegar na sua mão:" Vamos meu filho, temos que chegar em casa." E puxou a criança para fora. No meio da multidão ansiosa, Sandro falou: " Pai, compra para mim aquele brinquedo, por favor? É natal..." O pai prontamente respondeu: " Depois, meu filho. Depois..." No intimo, os dois sabiam que essa promessa não iria acontecer. O menino ainda chegou a dizer que tinha umas moedas guardas no cofre. Mas o pai permaneceu em silêncio.
Veio o dia de Natal, a arrumação da casa. A meia-noite, a família reunida entorno da mesa, comeram, beberam e brincaram. Depois, os filhos foram aos poucos indo dormir. De madrugada, Sandro ouviu uma conversa no quarto dos pais. Silenciosamente saiu do quarto e escutou. Ele nunca tinha visto o pai chorar e não entendia direito as palavras ditas naquela conversa com a esposa. Porém, as poucas palavras foram suficiente para compreender que se tratava dele e do episodio do brinquedo. O arrependimento bateu no coração e ele teve dificuldades em dormir.
Noutra ocasião, Sandro recebeu o presente de seu pai. Hoje ele é gente grande, lembra do pai e do xilofone e tudo isso lhe parece um sonho. 

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