domingo, 27 de novembro de 2016

Duas mulheres

Pelas mãos, a mulher segura a criança que ainda não entende bem a cerimonia. As pessoas em volta dela, se abraçam. Um rapaz toca violino, flores são jogadas.. De cabeça baixa, ela chora contida. E o caixão vai sendo aos poucos coberto com areia. - Diga adeus ao seu pai, nunca mais vai ver ele. A viúva sempre foi severa, linda e ordeira na economia de palavra, séria e controlada com os sentimentos. Agora, chora e por isso, o menino observa tanto ela.
Depois do velório, trocou as roupas. Nos domingos, vestia preto quando saia de casa para ir bem cedinho a missa e em seguida passar no cemitério para rezar um pouco e deixar flores no tumulo do marido. E assim, o fez durante meses. Mas num domingo, quando chegou ao cemitério, teve uma surpresa misteriosa. Viu velas e flores no tumulo do marido. - O que é isso ? Perguntou ao zelador. O homem sem entender direito respondeu: Acho que alguém veio,  acendeu as velas e deixou as flores. A mulher pensou consigo mesma: Como pode ser. Ficou irritado com aquilo. Teve vontade de apagar as velas e jogar as flores fora do tumulo. Aquele tumulo era do marido dela, alguém deve ter feito isso por engano. Mas, cumpriu o ritual que fazia todo domingo, sabendo que era difícil guardar dentro do tumulo o falecido marido que ainda escorria na memoria e no mistério.
Durante a semana foi a casa da sogra. Perguntou se tinha ido ao cemitério visitar o tumulo do filho no domingo. A senhora respondeu que não. A mulher disse  o que ocorreu no domingo passado, e que não sabia quem tinha feito a visita ao túmulo e uma tormenta se fez ali na cova.
No domingo seguinte, novamente velas e flores. Desfez aquilo e arrumou do seu jeito as flores e velas que tinha. Rezou. Lembrou que não era tão apaixonada por ele, teve outros que lhe interessava, mas estava descobrindo o ciume dentro de si. Saiu perguntando aos zeladores se tinham visto antes quem esteve no tumulo. Ninguém lhe respondeu uma afirmativa. 
Outro domingo e prevendo o que poderia ver, resolveu ir mais cedo. Nas primeiras horas, foi direto ao cemitério. Havia poucas pessoas no cemitério nessa hora. E para sua surpresa, já estava por lá as velas e as flores. Aquilo fez ela quase perder a razão e gritar. respirou fundo e pensou: Pode está por aqui.  Perguntou ao zelador que esteve no tumulo do marido. O zelador disse que foi a mulher que acabava de sair no portão principal. Ela correu, quando chegou ao portão viu a mulher sair num carro. Percebeu que ela estava grávida. Então tentou ir aos sábados a tarde para ver qual o horário que a mulher ia ao tumulo do marido.
Um desses sábados, chegou ao cemitério e viu que havia além das flores e das velas, uma carta no túmulo. Silenciosamente abriu e leu a mensagem. A mulher misteriosa também sabia dela e explicava o motivo de nunca ter se revelado a viúva.
" Cara senhora, peço desculpa se levantei dúvida sobre seu marido depois de morto. Há muito tempo realizei uma promessa por ter quase morrido Ir a todos os velórios durante o dia e ficar zelando por aqueles que deixaram suas viúvas. Contemplo o rosto de cada falecido, vejo os familiares e acompanho a cerimônia fúnebre. Visitar túmulos dos recém falecidos. Faço isso anonimamente essa promessa. Assinado Maria das Mortes" Ela lentamente  amassou o bilhete, fez um leve sorriso de sárcasmo e nunca mais foi ao cemitério visitar o tumulo do marido e deixou de usar preto.

sábado, 26 de novembro de 2016

Como uma criança não gosta de Papai Noel

Mais um dia claro e quente  de verão no semiárido. A diferença é que a noite será de Natal. A temperatura é forte e o vento seco da manhã em nada tira a sensação térmica. as ervas estão queimadas pelo sol.
Ao meio-dia, o ar é sufocante. No céu, nem uma única nuvem. Todas as pessoas fugiram do calor para esconderijos. O gritou da vó para o menino quebra o calor : - Sam, entre para o cozinha ! Desde cedo, ele veio arrumado para o tal "dia de natal", Logo, no café da manhã foi entrando na casa da avó dizendo: - Cheguei...Abrindo os braços e mostrando a roupa. Depois, tratou de ir brincar, bisbilhotar tudo que havia pelo imenso quintal. Um  planeta a ser explorado e pouco importava as dificuldades da roupa nova ou o calor. Samuel ainda tirou a camisa suada. Mas a avó começa a ficar aflita toda vez que aparecia no alpendre e olhava ele longe. - Sam, venha tomar um copo de suco que você gosta! O menino parou um momento, levantou a cabeça. Largou o pedaço de pau e correu para cozinha. Beber rapidamente o copo e saiu. A avó tentou explicar: - Meu filho, hoje a noite todos estarão arrumados com roupa nova e você vai ficar com roupa velha. Sam ainda disse: - Deixa para lá. E correu para o quintal. O pai de Sam chegou e viu aquela situação, já passava um pouco das onze horas. Agora, o menino montava pedras, tijolos e restos de telhas. - Sam, meu filho. Vamos, comprar uns presentes. O menino olho para o de longe: - Vou não. O pai ainda insistiu e saiu, Meio-dia, a avó tentar convence-lo  dizendo: Sam, hoje a noite papai noel vai dá presente para todo mundo e para as crianças obedientes. Desse jeito você, não vai ganhar nada. Sam olha para a avó: Papai noel é filho de uma rapariga. Em seguida, desmanchou seu brinquedo feito de areia e entulho, cruzou os braços, fez uma cara de choro e entrou para dentro da cozinha e deitou no chão zangado.


quinta-feira, 24 de novembro de 2016

O filhinho de papai

O casarão com o sobrenome da família se destacava dos demais na rua antiga. A pintura da frente estava desgastada, era agradável vê-lo, onde vivia uma família. O filho era estudioso e comportado, teve uma juventude igual a qualquer rapaz. No futuro, ele poderia  ter um emprego público, quiça uma carreira brilhante.  A mãe, dona de casa e esposa presente em todos os momentos, agora era uma viúva e o chefe da casa estava falecido, Coube ao filho ser o responsável pela casa, ou seja, a entrada e saída do dinheiro...
Após o velório, julgava as despesas desnecessárias e foi fazendo cortes. Os exageros deveriam ser contidos. Com o tempo foram aparecendo as dívidas e eram tantas que quando tapava um buraco, outro aparecia. A economia estava ruim e por consequência, a sociedade .O pai era um viciado em apostas e  jogador de cartas, isso lhe fez contrair as dividas. Além de ter uma irresponsabilidade com gastos.
Agora, o filho  trabalhava dobrado e se esforçava para ter um dinheiro extra. Sentindo-se afogado com as tarefas e os compromissos parecia carregar a honra de "seu pai Sérgio." Nada lhe aliviava o peso, nem em sonhos que eram sempre intranquilos. A insonia lhe visitava em certas noites. Não tinha tempo para os amigos, namoros ou divertimentos, embora que sua mãe lhe incentivasse a isso, O único divertimento era ir a missa com mãe e voltar para casa de braços dados com ela. Quem sabe um dia, no futuro, tivesse uma vida melhor, pois era um filho do capitalismo.

terça-feira, 22 de novembro de 2016

Sangue do meu Sangue

Zé das panelas teve uma vida difícil para sobreviver quando criança. Mas, conseguiu com esforço ter trabalho e constituir uma família. Rígido com mulher e mais ainda com os filhos, sempre dizia:" Quem não quiser seguir minhas ordens nessa casa, a porta está aberta." Há tempos atrás, expulso de casa um filho por rebeldia e proibiu qualquer comentário sobre ele. Além do controle familiar, Zé das panelas foi conseguindo mais poder. Testou sua influência na população e se elegeu vereador na cidade.
Seu destino tornou-se altos e baixos, mas ele estava conseguindo ir longe. Quem sabe no futuro ser perfeito. Tinha apoio para isso. Sabia conversar e era uma estrategista de primeira, sem nunca ter lido Maquiavel. Os filhos eram encaminhados ao seu gosto e interesse. A esposa era obediente e recatada. 
Certa vez, Zé começou a sentir alguns sintomas...cansaço, inchaço da barriga e tontura. Justo naquele momento em que tudo ia bem, aparece uma doença para estragar a paz. Marcou consulta médica. Conversou com doutor e explicou o que estava acontecendo com ele. O doutro mandou fazer uns exames para depois do resultado dizer o veredicto final. Uma semana depois, novas consulta. O doutor leu o resultado. E pediu mais uma exame. Zé começou a ficar preocupado. Mas o doutor tratou de acalma-lo.
O ultimo exame na mão, Zé foi com ao médico acompanhado da fiel esposa. O doutro disse que se tratava de leucemia. Zé teria que procurar um doador de médula na família. Em casa, Os filhos foram fazer a doação para ver quem poderia ser compatível ao pai. Os resultados davam incompatibilidade. Enquanto o pai perdi peso e cabelos. Os parentes fizeram a doação de medula, E nada. O desespero apoderou de todos. O grande pai poderia morrer e o poder que acumulou esfarelar, pois os filhos eram indiferentes a herança. Na cidade, os moradores procuravam uma medula fora da família para cura-lo. 
Certa manhã, a casa grande ainda estava em silêncio. A mãe já tinha acordado e estava tomando café quando o filho mais velho apareceu e sentou perto, ela falou: "Só falta uma pessoa para fazer a doação da médula." O filho franziu a testa e disse: "Quem ?"  A mãe suspirou e respondeu:" Seu irmão que ele expulsou de casa na adolescência por ser homossexual. Perdi o contato, mas acredito que o cabeleireiro tem o numero do telefone. Será que seu pai aceita a médula dele ?
A esposa esperou o momento certo conversou com o marido debilitado pela leucemia que para não morrer cedeu os orgulhos e preconceito e permitiu reatar o contato com filho. A mãe explicou para ele toda situação e ao mesmo passava na memória as cenas de castigos e humilhações do pai para com filho. O filho esquecido atendeu ao pedido da mãe, veio até a terra natal e fez o exame de compatibilidade de médulas. Doou a médula, salvou o pai da morte, mas não teve o pedido de desculpas e o retorno a convívio familiar.

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

O Furinho

No domingo poderíamos ter um pouco de prazer para quem passava a semana somente com alimentação trivial. Nesses tempos de crise econômica, os cortes são feitos no pouco de divertimento que temos. A feira do mês, os pais chegavam com cada vez menos sacolas. No entanto, uma lata de leite Moça para fazer um pudim e servi-lo na tarde de domingo era o luxo da família e depois de aberta era disputada pelos 5 filhos que faziam sua limpeza a dedo.  Os filhos eram comuns a quaisquer outros...unidos e desunidos conforme a situação. O mais velho com 13 anos, Marcos tornava-se mal criado e o mais novo Francisco com 8 anos, sonso. Ainda havia Paulo com 9 que sonhava em ser cantor famoso e Rodrigo com 12 anos queria ser jogador de futebol. Flavio era o intermediário 10 anos, meigo e sempre pronto para ajudar a mãe. Seus olhos brilhavam ao verem a lata sair da sacola do supermercado. E o desejo só aumentava com o passar do tempo, queria antecipar-se ao sabor do leite Moça;
Certa vez não se conteve, ficou com insonia de saber que lata estava na geladeira. Aquilo lhe atormentava, o coração batia acelerado enquanto os demais familiares dormiam na casa. Não se conteve e silenciosamente foi até a geladeira, fez um furo minusculo e sugou um pouco do leito. Voltou para a cama, onde dormiu satisfeito.
No domingo, a mãe foi fazer o tradicional pudim de leite para aliviar a amargura da semana. Ao abrir percebeu o furo e a quantidade pequena de leite. Ainda assim, fez o pudim e reclamou aos filhos. O pai ficou enfurecido. Ninguém assumiu o furo. Criou um clima de perseguição entre os filhos sobre quem seria o responsável sobre o crime. Alguém teria que ser culpado por aqui.
No inicio do mês, os pais vieram das compras do supermercado. As sacolas cheias de mantimentos. Tiraram um por um. E por fim, saiu a lata de leite condensado. Os olhos de Flávio tentaram desfaçar o desejo de pecar. Mas, acredito que até alguns esqueceram do que houve e do clima chato que ficou na casa durante os dias.
A noite de sábado veio e a ansiedade nas horas que Flavio escondia como um segredo. Aos poucos a casa foi se enchendo de silêncio. O pai e a mãe foram dormir. Ele deitado na cama, tentava dormir. O coração parecia lhe falar : vá. fure a lata. Seja valente. E batia acelerado. Veio um calafrio e na escuridão, Flavio caminhou em direção a geladeira. Abriu um pouco. E Pegou a lata de leite furou e sugou o leite de olhos abertos o quanto pode.
De manhã, o pai e a mãe descobriram o ocorrido. O pai anunciou a todos: Alguém vai ter que assumir o furto do leite...ou todos levaram uma surra. Pânico Geral. A mãe tentou amenizar o situação, mas o decreto estava feito. O pai deu a sentença: Amanhã, quando voltar do trabalho de noite. Um de você terá que assumir que furou a lata ou todos sofreram.
Aos poucos os filhos foram de acusando entre si.
A segunda-feira nesse dia tinha um sentido, quando no horário tradicional, o pai veio. Trocou de roupa e retirou a chinela. Chamou os filhos e colocou lado a lado. Fui chamando um a um, Batia a chinela na palma da mão. O barulho causava pânico. Pouco a pouco, o choro chegou. Então. levantou a mão. E chorando disse: Pai, fui eu quem furei a lata esse tempo todo. O pai ficou paralisado com confissão de Rodrigo. Mas também Marcos também assumiu que fez o mesmo e Flávio olhando para os irmãos, disse que era autor do furto noturno igual aos irmãos. Disse da ansiedade que tinha em fazer e a dureza de passar a semana sem nenhum doce. Enfim, quase todos sugaram um pouco do leite Moça. Em uma época onde as dificuldades econômicas eram desafios para a sobrevivência como também para se conseguir um prazer mesmo proibido, somos provocados a sermos sorrateiros.

sábado, 19 de novembro de 2016

A Ceia de Natal

Anos atrás foi convidado a passar a noite de natal com a família de um amigo. Não conhecia ninguém na casa e passei a noite  independente dos demais. Fiquei observando as pessoas por ali do começo ao fim da ceia. Cheguei cedo e aos poucos foram vindo todos os familiares. No centro da sala, havia uma árvore iluminada e presentes em baixo, ao lado um presépio. Todos pareciam animados falando alto e rindo. As crianças corriam de um lugar para outro. Com o passar das horas, vi quem mais era importunado por todos. Ora com um petisco, ora para encher sua taça ou por saber se faltava algumas coisa. Trata-se do mais rico comerciante do bairro. Antes da ceia, o dono da casa, reuniu todos e pediu um minuto de silêncio. Falou algumas palavras e em seguida começou um Pai-Nosso e depois uma Ave-Maria. Todos rezaram com ele. A distribuição dos presentes criou grande expectativa entre as crianças. Num minuto, os papeis de presentes estavam no chão e os brinquedos a mostra.
A ceia tornou-se outro momento memorável,  Sentados pelos cantos da casa, os grupos de pessoas conversaram com os pratos nas mãos. Foi ai que percebi a presença de um homem perdido no meio dos convidados. Sentado na cadeira, ele alisava o braço da cadeira. Era alto, forte e de barba. Quando percebi a presença dele, observei que ninguém lhe ofereceu nada ou parava para conversar com ele. Isolado igual a mim naquela família durante a ceia de Natal. Os convidados já demonstravam que estava animados pelas taças de vinho. Se mostravam gentis entre si. Cantavam e dançavam.O homem sentado no sofá, coçou a manga da camisa, mostrando uma cicatriz de corte. A partir do gesto notei que conhecia ele, mas não lembrava. Puxei na memoria aquela marca. Olhei para ele fixamente e foi com o passar do tempo que veio a clareza: tratava-se de um inimigo de infância que tive e sofri muito nas mãos dele. Nenhum dos presentes saberia que visões terríveis tive ali e me povoaram a memória, das humilhações e vergonhas que vivi com aquele homem quando era uma criança. O homem de cicatriz era o papai Noel da festa.

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Presente de Natal.

Depois da festa de natal, Maria Rita levou seu presente para passear. Tratava-se de uma boneca simples que ela tanto desejava ter como amiga imaginária. Foi até a praça e colocou a boneca num banco da praça, começou a conversar. Explicou como era a cidade e cada membro da família. Falou principalmente da mãe. Depois disse onde estudava. Maria Rita pegou flores e colocou no bolso do vestido da boneca. Noutro bolso colocou pedras. Resolveu brincar de esconde - esconde com amiga. Primeiro contou a 10 e saiu para procurar o a boneca. Achou e fez a maior felicidade. Em seguida, foi a vez dela. Deixou a boneca no banco e saiu para se esconder. Voltou e não encontrou mais sua boneca. Ficou ali procurando pelos cantos e nada de encontrar. O desespero tomou de conta dela. Sentou no banco e chorou baixo, balançando as pernas. 
Pouco tempo depois passa um homem e ver Maria Rita chorando e se aproxima. Pergunta por que motivo ela chora. Ela fala entre soluços que perdeu a boneca. O homem comovido com a garotinha resolveu procurar a boneca. Demoraram um tempo até  os dois se cansarem, mas a menina chorava. Então, ele combinou dela voltar para casa e no dia seguinte se encontrar, Na manhã seguinte, a menina estava lá, sentada no banco. Pouco tempo depois, o homem aparece. Traz um pequeno envelope com um bilhete escrito: Por favor, não se preocupe comigo. Fiz uma viagem pelo mundo. A menina ler o bilhete e se conforma. Um ano depois, está lá a menina na praça. O homem chega e lhe mostra outra boneca. Dentro dela havia uma pequena  mensagem: Veja como eu mudei e voltei.