quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Livro da vida

Sempre tive predileções diversas, entre elas era ler livros. Morava numa casa, suficientemente boa para viver, as plantas já faziam parte da decoração, os desenhos e pinturas nas garrafas ficavam num quarto especial. Os livros eram espalhados pela casa. Nenhum lugar era despossuído deles. Certa vez, após um dia todo lecionando nas escolas, voltei para casa. Era o entardecer, desses que a beleza das cores se vem no céu. Entrei em casa e pela janela, via o espetáculo enquanto tomava um cafezinho e pensava solto. A rua acompanhava uma ladeira e a casa ficava na parte baixa. Reparei num homem vindo em direção a casa. Pouco tempo ele bate no portão, abro e  me cumprimenta e pede água. Era um homem ainda novo e se vestia com roupa social. Trazia uma mala preta de executivo e se logo dizendo que era um "troca de livros", pela voz e pronuncia percebi que era do Sul. O seu tipo físico poderia ser de homem do Norte. Convidei para sentar numa cadeira na área. 
O visitante me mostrou qual o interesse dele: levar um livro e deixar outro. Sugestivo para quem gosta de leitura. Porém, ele diria qual livro queria levar de mim. Como pode saber quais livros tenho em casa ? Nunca contei para ninguém, apenas emprestei alguns que vieram e outro que nunca voltarão. Pensei um pouco sobre a proposta. Foi então que o desconhecido quebrou o silêncio entre nós e disse: Sei que é um livro simples o que quero de você. Em compensação darei um livro especial de volta. Então falei: Qual o livro que você quer ? O homem de paletó e gravata falou: A bíblia que você possui em casa. Daí, indaguei:: Você é religioso ? E ele respondeu: Assim como você, não tenho religião e deus. Mas estou para cumprir um promessa de pegar as sagradas escrituras numa casa de incrédulo.
O visitante abriu a pasta e me mostrou o livro de capa dura. Não havia escrito o titulo e nem o autor. Sem pensar, fui ao quarto e peguei a bíblia velha que tinha, nem sei qual a editora. Parece que enfeitiçado por aquele escambo de livros, entreguei e recebi ao mesmo tempo o livro. Só quando o homem saiu e fechei o portão notei que era noite. Sentei e resolvi abrir o livro. A surpresa foi maior, as páginas estavam em branco. Não havia uma com nada. E o mistério seguiu a noite. Voltei a fazer as tarefas de casa, mas a ideia de ter um livro sem nada me intrigou. Fui dormir e a ideia do livro no outro quarto me dava insônia. Antes de amanhecer, me levantei e fui ver o livro branco.
Ao meio - dia quando voltava para casa, um velha com cajado e rosto cheio de rugas me parou e pediu umas moedas. Tirei algumas do bolso e estendi nas suas mãos. Num gesto rápido, ela devolveu e disse: Se o espaço é infinito, estamos em qualquer lugar. Se o tempo é também infinito, estamos em qualquer ponto do tempo. Essas palavras conseguiram traduzir o que deveria fazer com o livro em casa. 

Nenhum comentário: